sexta-feira, 4 de julho de 2025

"Competência do IOF é do Executivo", diz Guilherme Dolabella, procurador do DF

 "Competência do IOF é do Executivo", diz Guilherme Dolabella, procurador do DF

Ele explica que a Constituição trata do tema sem controvérsia e frisa: o decreto que aumentou as alíquotas do imposto não é passível de ser sustado pelo Legislativo, conforme estabelecido pelo parágrafo 1 do artigo 1

Guilherme Dolabella,  procurador, doutor em direito financeiro pela USP e advogado -  (crédito:  Arquivo Pessoal)Guilherme Dolabella, procurador, doutor em direito financeiro pela USP e advogado - (crédito: Arquivo Pessoal)                                                                                                                             Lisboa — O procurador do Distrito Federal Guilherme Dolabella, doutor em direito financeiro pela USP e também advogado do escritório Barreto Dolabella Advogados, está em Portugal acompanhando os debates do Fórum de Lisboa justamente num momento em que as questões fiscais estão na ordem do dia, com a crise do IOF. Com seus profundos conhecimentos sobre o tema, Dolabella analisou, a pedido do Correio, o debate do ponto de vista técnico. O procurador explica que a Constituição trata do tema sem controvérsia: "O decreto que aumentou alíquotas do IOF é uma competência do Executivo, que não é passível de ser sustada pelo Legislativo, pois está expressa no art. 153, parágrafo 1"        ministro Flavio Dino, em palestra, disse que a questão do IOF é juridicamente muito simples. O problema, segundo ele, é politico. Qual é o foco do debate?                                                                                                        A tese jurídica é a competência do Poder Executivo para alterar a alíquota do IOF, conforme previsão do art. 153, parágrafo 1, da Constituição de 1988. Paralelamente, há a questão relativa à competência do Congresso em sustar atos 
normativos dos Poder Executivo que exorbitem o poder regulamentar ou delegação concedida pelo Poder Legislativo, conforme art. 49, inc. V da Constituição de 1988. Portanto, a essência do litígio institucional relativo ao IOF está na definição constitucional da competência de cada um dos Poderes. Entendi que a solução caminha para reconhecer que a competência, nesse caso, é do Poder Executivo, dado que a alteração de alíquotas do IOF não se insere nos parâmetros constitucionais de exercício de poder regulamentar, definido no art. 84, inc. IV da Constituição ou a delegação legislativa, prevista no art. 68 da Constituição.                                                                                                                                                 O Congresso tem competência para derrubar um decreto presidencial que trata do aumento das alíquotas do IOF?

Por isso é que o ministro Flávio Dino fez o comentário sobre a desnecessidade de uma declaração do STF sobre o tema, já que a própria Constituição estabelece expressamente os limites e as competências do Executivo e do Legislativo nesse caso. O decreto que aumentou alíquotas do IOF é uma competência do Executivo que não é passível de ser sustada pelo Legislativo, pois está expressa no art. 153, parágrafo 1.

O ex-presidente Michel Temer afirma que o IOF não pode ser usado para aumentar a arrecadação porque o imposto existe para regular as relações fiscais. Como avalia esse ponto?

Em relação à declaração do ex-presidente Michel Temer, é necessário fazer uma análise sob dois aspectos: 1) a natureza tributária do IOF; 2) os impactos econômicos da tributação pelo IOF. Sobre o primeiro aspecto, não existe a separação da essência fiscal do tributo de sua característica extrafiscal. Todo e qualquer tributo tem finalidade arrecadatória, pois provê recursos privados para o Tesouro. A discussão é: sob o ponto de vista extrafiscal, vale a pena aumentar as alíquotas do IOF. Ai, é um exame dos efeitos econômicos do tributo e, sob essas circunstâncias, o IOF onera atividades econômicas diversas e o consumidor final, pois é um custo e se insere no preço. Portanto, entendo que a crítica realizada pelo ex-presidente Michel Temer ressalta esse viés regulatório e extrafiscal do IOF e seus efeitos econômicos. Mas todo e qualquer tributo existe para prover recursos financeiros para o Estado e, adicionalmente, a depender das suas características, influencia os agentes econômicos em direção a determinada ação/conduta desejada pelo governo.

Se o STF mantiver a derrubada do aumento, terá de definir de onde vão sair os recursos para cobrir o deficit fiscal ou isso é papel do Executivo?

Se o STF deliberar pela validade do decreto legislativo sob a ótica da competência do Congresso, a decisão irá se restringir à declaração de constitucionalidade do ato legislativo. Eles não podem adentrar no campo legislativo e definir a origem de recursos que o Poder Executivo objetiva obter. Caso contrário, seria também uma usurpação de competência do Congresso. Aliás, essa é uma das competências legislativas clássicas e historicamente uma conquista liberal, pois significa o consentimento da sociedade em relação a tributação por meio de seus representantes eleitos.

Muitos políticos estão falando em conciliação para resolver essa questão, intermediada pelo STF. Como seria?

A ideia de conciliação seria um caminho idêntico a situações em que o STF exerceu o papel de mediador nos episódios de crise entre os Poderes. Tivemos essa iniciativa de convocação de audiências de conciliação entre representantes da AGU e do Senado e da Câmara dos Deputados no caso das emendas Pix e, também, na definição do marco temporal das terras indígenas. Em relação ao IOF, acredito que o STF buscaria uma distensão entre o Executivo e o Legislativo, por meio da revogação do decreto legislativo relativo ao IOF e a apresentação de novo decreto pelo Executivo ou medida provisória que contemple parâmetros de tributação e obtenção de novos recursos aceitáveis sob o ponto de vista político e econômico.

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