quarta-feira, 29 de abril de 2020

Solidariedade e integração das favelas - Willian de Paula e Carla Grigorio



Dafne Ashton e Mariana Mollica entrevistam Carla Grigorio, moradora do Lins de Vasconcelos (educadora, ativista social e racial,co-fundadora do Frente Favela Brasil,editora do Portal Favelas, Movimento Popular de Favelas) e Willian de Paula, o Ninho Vidigal (Prof. de Educação Física, capoeira, ator, Conselheiro Tutelar e um dos idealizadores do Politilaje).





sexta-feira, 24 de abril de 2020





O QUE REALMENTE PRECISAMOS SABER Organização Mundial de Saúde - OMS já considera que, sem vacina, sociedade terá de conviver com vírus


Nos bastidores e sem fazer enormes anúncios, técnicos da OMS (Organização Mundial da Saúde) e mesmo de certos governos começam a trabalhar com a ideia de que o mundo terá de aprender a conviver com o coronavírus. Pelo menos até que uma vacina chegue ao mercado, o que só deve ocorrer a partir de meados de 2021 — daqui um ano. Nesta semana, um sinal disso foi revelado por Michael Ryan, diretor de operações da agência, que defendeu um "novo normal na sociedade até termos soluções mais permanentes". Ou seja, uma vacina.
Ao longo dos últimos dias, líderes passaram a introduzir algumas dessas mensagens em suas declarações formais. O diretor-geral da OMS, Tedros Ghebreyesus, por exemplo, foi claro em alertar que o vírus "vai estar conosco por um longo tempo". Dias antes, ele alertou que, "em última instância, vamos precisar de uma vacina" para controlar a pandemia. A chanceler alemã, Angela Merkel, foi a primeira a declarar abertamente que estamos apenas no "início" da pandemia. Se inicialmente existia uma mensagem enfática de que o vírus poderia ser contido, dentro da OMS o discurso hoje começa a mudar depois do registro de mais de 2,5 milhões de casos. Por semanas, enquanto o número de casos no exterior não chegavam a mil, a organização insistia que ainda havia uma "janela de oportunidade" para que governos pudessem se preparar.
Mas a falta de preparação de muitos países, o negacionismo por parte de certos líderes, a velocidade de transmissão do vírus e o desafio de lidar com a pandemia em zonas pobres passaram a moldar uma nova resposta. A agência não abandonou a meta do controle, mas ficou claro que a tarefa não será cumprida totalmente no curto prazo. Surpreendeu a OMS o fato de que países que controlaram a transmissão viram o ressurgimento do vírus. Isso por conta de uma parcela significativa da população não estar imunizada.
Só quarentena não vai acabar com o vírus
Internamente na entidade, a constatação é de que as quarentenas funcionaram. Mas, por si só, não vão acabar com vírus. Elas darão tempo para que governos se preparem para lidar com o fluxo, identificar cada caso e isolar todos, além de fortalecer seus sistemas de saúde. Só assim estaria garantido que grandes surtos sejam transformados em episódios limitados geograficamente. Uma das percepções é de que, com a pressão econômica e social pesando, governos vão gradualmente retirando restrições e quarentenas. Mas medidas de distanciamento social continuarão, um dos elementos desse "novo normal". Isso, em alguns países, já começa a ser implementado. Na França, classes de escolas terão menos alunos e locais de trabalho terão novas regras. Um número de máximo de pessoas dentro de lojas também foi estabelecido em outros outros países. Aglomerações não devem ser a regra por meses, pelo menos na Europa. Na Alemanha, a Oktoberfest, com 6 milhões de turistas e receita de 1 bilhão de euros, foi anulada. Madri cancelou todos seus festivais até outubro. Na Suíça, o tradicional Festival de Jazz de Montreux no final de julho também foi anulado.
Futebol em setembro, sem público
Quanto ao futebol, a possibilidade de jogos sem torcida já deixou de ser apenas um dos cenários e passou a ser considerado uma alternativa realista. Na Holanda, o esporte deve voltar a ser disputado em setembro. Para Ryan, da OMS, trazer de volta eventos esportivos ou qualquer grande evento vai exigir um planejamento cuidadoso. "Entidades e governos terão de avaliar sobre como devem se adaptar", alertou. Ele admitiu, porém, que ainda que a ciência tenha de pautar as decisões, medidas terão de se adaptar à vida prática. "Temos de ter um novo contrato social para compartilhar os riscos", disse.
Protestos e distúrbios sociais
Outra preocupação se refere ao impacto profundo que as quarentenas estão tendo entre as camadas mais pobres. Na ONU, o grande temor é de que, sem um apoio sólido a essa população, as restrições gerem "distúrbios sociais" e desestabilizem governos. Num documento interno das Nações Unidas sobre o impacto da pandemia nos direitos humanos, a entidade admite que falar em lavar as mãos é um desafio para 2,2 bilhões de pessoas que não têm água em casa. No mundo, 1,8 bilhão ou não tem casa ou vivem em locais inadequados. Distância social, portanto, é apenas um sonho para tal camada da população. "A pobreza é um fator de risco", diz a ONU. "Temos de encontrar um caminho para o futuro, que equilibre o risco do vírus com o risco para a renda das pessoas", disse Ryan.

Jamil Chade

quinta-feira, 16 de abril de 2020





OLHANDO PRO CÉU Cientistas descobrem supernova mais brilhante já observada





A supernova SN2016aps tinha uma massa entre 50-100 vezes maior que o Sol


Equipe internacional de astrônomos calculou que explosão estelar ocorrida há quase quatro bilhões de anos emitiu cinco vezes mais energia do que qualquer outro evento do tipo registrado.

Quando os astrônomos descobriram uma supernova em 2016, ela já causava espanto pelo intenso brilho que ofusca sua própria galáxia.
Agora, uma equipe internacional de cientistas acredita que a explosão da estrela ao morrer, conhecida como SN2016aps (e que ocorreu há quase quatro bilhões de anos), é a mais brilhante e possivelmente a mais forte já detectada.
Os astrônomos, que publicaram suas descobertas na revista Nature Astronomy, também suspeitam que a SN2016aps possa ser uma espécie de supernova conhecida como "instabilidade do par pulsacional" - e cuja existência só fora prevista teoricamente.
1.000 dias de radiação
Isso ajuda a explicar por que a SN2016aps parece uma novidade para os astrônomos. Depois de observada inicialmente em 2016, a supernova continuou emitindo radiação por mais de mil dias.
"Em uma supernova típica, a radiação é inferior a 1% da energia total. Mas na SN2016aps, descobrimos que a radiação era cinco vezes a energia de explosão de uma supernova de tamanho normal", disse Matt Nicholl, da Escola de Física e Astronomia na Universidade de Birmingham e um dos autores do artigo Nature Astronomy.
"Esta é a luz mais forte que já vimos emitida por uma supernova", acrescentou.
A equipe de astrônomos de várias instituições observou a SN2016aps por dois anos até que ela diminuísse para 1% do seu ponto mais brilhante. Isso lhes permitiu calcular, entre outras coisas, a massa da supernova: algo entre 50 a 100 vezes maior que a massa do Sol.

As supernovas observadas anteriormente tinham cerca de 8 a 15 vezes mais massa que o nosso Sol. A galáxia em que a supernova foi descoberta nem tem nome. Sua distância é de cerca de quatro bilhões de anos-luz da Terra, de acordo com Edo Berger, da Universidade de Harvard, outro cientista envolvido no projeto. 'Olhando para trás' Não é a supernova mais distante já descoberta - esse registro pertence à DES16C2nm, localizada a 10,5 bilhões de anos-luz de distância. Mas aconteceu longe o suficiente para oferecer aos astrônomos a chance de "viajar pelo tempo" aos primórdios do universo. "Encontrar esta supernova extraordinária não poderia ter acontecido em um momento melhor", disse Berger.

"Com o novo Telescópio Espacial James Webb da Nasa, poderemos ver eventos semelhantes tão distantes que podemos voltar no tempo para a morte das primeiras estrelas do universo".

CIÊNCIA E TECNOLOGIA

120
Novo estudo sugere que nossos ancestrais começaram a andar sobre duas pernas devido a supernovas ou explosões de estrelas que atingiram fim de suas vidas.
investigação foi realizada por uma equipe de pesquisadores liderada por Adrian Melott, professor emérito de física e astronomia da Universidade do Kansas, EUA.
Segundo descreve o portal Phys.org, há cerca de oito milhões de anos, as supernovas bombardearam a Terra com energia cósmica, tendo o bombardeamento atingido apogeu há cerca de 2,6 milhões de anos. Na época, uma avalanche de elétrons começou a cair na baixa atmosfera de nosso planeta, provocando uma cadeia de eventos que levou ao bipedismo em nossos ancestrais, indicam cientistas.
Mas como um evento poderia ter provocado o segundo? Supõe-se que a ionização atmosférica poderia ter causado um enorme aumento no raio que, por sua vez, causou incêndios florestais. Isso poderia ser uma das razões pelas quais os hominídeos começaram a andar sobre duas pernas: tiveram que se adaptar às savanas que substituíram as florestas queimadas no nordeste da África.
"Acredita-se que já havia uma tendência para os hominídeos andarem sobre duas pernas mesmo antes deste evento", disse Adrian Melott.
"No entanto, eles se adaptaram principalmente para escalar árvores. Depois dessa adaptação à savana, os hominídeos tinham que caminhar muito mais frequentemente de uma árvore para outra através de prados, então era melhor andar erguidos: eles podiam ver acima da grama e detectar predadores", acrescentou.
Incêndios florestais que criaram savanas
Uma análise geológica nos fundos marinhos do mundo mostrou que a ionização da atmosfera por raios cósmicos viria de uma supernova que explodiu na vizinhança da Terra, a uns 163 anos-luz de distância, durante a transição do Plioceno à Idade do Gelo há 2,6 milhões de anos.
"Aparentemente, essa foi a mais próxima de uma série [de explosões de supernovas] muito mais extensa", disse autor do estudo, acrescentando que essa "teria aumentado 50 vezes a ionização da atmosfera inferior".
O pesquisador Brian Thomas disse que, como resultado da ionização, o número de relâmpagos aumentou, provocando também o aumento de incêndios florestais.
Segundo o autor do estudo, "esse aumento de incêndios estimulou a transição da floresta para a savana em muitos lugares […], o que se acredita estar relacionado à evolução humana no nordeste da África". "Especialmente, no Grande Vale do Rift, onde todos esses fósseis de hominídeos são encontrados", concluiu.

terça-feira, 14 de abril de 2020

PARA ESTUDIOSO DO CLIMA, "SORTE" EXPLICA PANDEMIA NÃO COMEÇAR PELO BRASIL


"A Amazônia tem a maior quantidade de microorganismos do mundo. E estamos perturbando o sistema o tempo todo, com populações urbanas se aproximando, desmatamento e comércio de animais silvestres. Então, talvez tenha sido sorte que a pandemia não tenha começado no Brasil", disse Carlos Nobre, presidente do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas e pesquisador sênior do Instituto de Estudos Avançados " da USP (Universidade de São Paulo).
Nobre participou nesta terça de um seminário "Covid-19 e Clima: Como Estão Conectados?" promovido pela Rede Brasil do Pacto Global da ONU (Organização das Nações Unidas) em parceria com Ecoa, que retransmitiu sua palestra, no formato webinar, ou seja, um seminário pela web.
"Pandemia mostra impacto do desequilíbrio do sistema na nossa vida"
Ele lembrou do caso da leishmaniose, endemia típica da Amazônia que tem como causador um protozoário e o vetor é o mosquito palha. A doença se espalhou pelo mundo, devido à aproximação dos homens dos ambientes silvestres, mas agora está controlada, tendo cura e remédio. O problema agora é outro por lá. "Agora, Manaus está entrando em colapso com o coronavírus, e a doença está chegando às aldeias. Temos que lembrar que os indígenas têm menos resistência imunológica a essas contaminações."
Nobre também falou como a poluição debilita quem tem contado agora com o vírus surgido na China no final de 2019. "A poluição e o vírus atacam o sistema respiratório. Essa combinação é muito perversa", afirmou o estudioso.
Ele recordou das queimadas na floresta amazônica em 2019, a que ponto isso afetou os ares até da região Sudeste do Brasil e como esse cenário pode se repetir agora em 2020, quando se está verificando novos recordes de desmatamento.
O ar de São Paulo e outras cidades está mais limpo com menos carros em circulação nesses dias de quarentena, mas, se as queimadas recomeçarem, esse cenário vai mudar e criar novas vulnerabilidades. No ano passado, os postos de saúde da Amazônia estavam cheios pela fumaça das queimadas. Agora estão com a Covid-19.
Aprendizados da crise
O cientista discutiu os vários pontos que aproximam o atual surto biológico com os problemas climáticos, sua especialidade.
"Dá para fazer um paralelo entre essas crises globais. Essa pandemia nos mostra o que pode acontecer quando há um desequilíbrio do sistema. Ela é um alerta e um guia para evitarmos grandes riscos, como os que as mudanças climáticas poderão trazer para a vida na Terra. Se a temperatura do planeta subir cinco graus, os humanos vão ter de viver confinados, como agora, porque em determinados horários todos os dias o termômetro vai estar além do limite fisiológico do corpo nas áreas tropicais como o Brasil."
Nobre falou das lições que podem ficar desta crise global e das possíveis soluções quando o planeta sair das urgências do coronavírus. Para ele, um dos aprendizados é que a economia caminhe para a sustentabilidade.
"Os países europeus estão discutindo agora uma economia mais verde. E a China também está sinalizando nesse mesmo caminho. Se isso acontecer, o pêndulo mundial vai mudar, e o Brasil vai ter de ir atrás. Os EUA são contra, mas isso pode mudar se em janeiro de 2021 não estiver mais o Donald Trump na Casa Branca", afirmou Nobre, projetando as dificuldades de reeleição do político republicano com a possível recessão provocada pelo afastamento social durante a crise.
O pesquisador também salientou que é importante mudar a matriz energética, e essa crise pode ser o momento de acelerar esse processo. "Precisamos eletrificar os transportes, e criar mais energia solar e eólica, diminuindo o consumo de combustíveis fósseis."
Para ele, as mudanças climáticas vão trazer riscos maiores que os atuais com o coronavírus se não forem tomadas providências. "É uma catástrofe com um tempo e uma magnitude muito maior. Por isso, é difícil dimensionar. Mas a atual pandemia é uma amostra disso. E um risco maior também, afinal, todo o planeta vai ser afetado, não só o homem, como agora."..

Coordenador do MST lança livro sobre reforma agrária no mundo e propõe que no Brasil ela seja baseada na agroecologia

Para o líder do MST, as mobilizações contra o governo precisam crescer.


Para o líder do MST, as mobilizações contra o governo precisam crescer. (Foto: Valter Campanato/ABr)
Além do país nunca ter conseguido promover uma reforma agrária, o debate sobre o tema por aqui pouco foi travado, visto que pesquisas e debates foram retirados de livros e universidades por imposição da hegemonia neoliberal, a partir da década de 90.









Pensando na falha histórica de distribuição de conhecimento, o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), João Pedro Stedile, decidiu escrever "Experiências históricas de reforma agrária no mundo - Volume I", publicado pela Livraria Expressão Popular.
Na série de relatos sobre a reforma agrária no mundo, o autor sucintamente busca dar luz a experiências em países que viveram o processo. Ao mostrar exemplos, Stédile ressalta que é impossível querer copiar modelos, porque cada país tem correlação de forças específicas e lutas com características próprias.
Em entrevista o Brasil de Fato, o escritor afirma que, diante do momento em que vivemos, a nova missão dos camponeses é a de “zeladores da natureza”. Segundo ele, é preciso que o foco dos trabalhadores do campo, agora, esteja na produção de alimentos saudáveis para toda a sociedade, com base na agroecologia.
Para que a reforma agrária aconteça, de fato, no Brasil, é preciso que todas as forças populares da sociedade estejam unidos em um só propósito: dispor os bens da natureza a todos sem destruí-la.
Leia a entrevista completa:
Brasil de Fato: O que as experiências de reforma agrária narradas no livro nos ensinam para o presente?
João Pedro Stedile: O livro tem como objetivo principal trazer ao conhecimento do público brasileiro, sejam militantes ou não, de quais foram as principais experiências de reforma agrária no mundo, de uma forma sucinta, com suas principais características. 
Por outro lado, motivado também pelos debates nos movimentos camponeses em geral e na via campesina internacional, criei uma sistematização própria, classificando os diferentes tipos de reforma agrária, entre reformas clássicas, reformistas, radicais e populares. Neste primeiro volume, procurei publicar um ou dois países de cada tipo, para que o leitor tivesse uma ideia geral, de como aconteceram.
É impossível querer aplicar no presente ou querer “copiar” qualquer um entre os diferentes tipos de reforma agrária, porque elas são fruto da experiência histórica de luta social e da correlação de forças que houve em cada país, em cada sociedade, quando foram realizadas. 
Nós, no Brasil, tentamos em diversos períodos históricos implementar a reforma agrária clássica, que foi realizada sob hegemonia da burguesia industrial em outros países, para desenvolver as forças produtivas capitalistas. Mas fomos derrotados em todas elas. Tivemos a primeira oportunidade na saída da escravidão, mas negamos aos ex-trabalhadores escravos o direito de acesso à terra, ao contrário dos Estados Unidos, por exemplo, ou do Haiti.
Depois, na fase do capitalismo industrial, de novo preferimos adotar o sistema da grande propriedade exportadora para suprir as necessidades de importação da burguesia industrial. Por último, quando na década de 1960 o modelo industrial entrou em crise, de novo perdemos a oportunidade de uma reforma agrária clássica, com a proposta do Celso Furtado, que foi derrotado pelo golpe empresarial-militar de 1964. Depois disso, só tivemos experiências pontuais, parciais, de assentamento e não de reforma agrária ampla.
De que forma alastrar e aprofundar o debate sobre reforma agrária nas bases do campo, principalmente em locais distantes dos grandes centros?
Ainda que não seja o objeto do livro, o debate da necessidade de uma reforma agrária no Brasil agora passa por outros parâmetros. No passado, com as propostas e experiências concretas de reformas agrárias, sejam clássicas, radicais ou reformistas, o objetivo era, por um lado, democratizar o acesso à terra como bem da natureza às massas trabalhadoras, e, portanto, garantir o direito à terra a quem nela trabalha, que foi a grande bandeira popularizada pela revolução mexicana com Emiliano Zapata. Por outro lado, gerar um grande mercado interno consumidor, de parte da massa de camponeses, inserindo-os na produção de bens para o mercado, portanto, mercadorias, e com isso desenvolver as forças produtivas internas e o capitalismo industrial.
Agora os paradigmas a serem resolvidos por uma reforma agrária são de outro tipo. A burguesia não tem interesse em democratizar o direito à terra, e nem o capitalismo precisa dos camponeses. Então o que está na pauta, agora, é a produção de alimentos saudáveis para toda sociedade, baseados na agroecologia, a forma de utilizar os bens da natureza (terra, água, biodiversidade, minérios, energia) para que eles estejam à disposição do bem comum, de toda sociedade, e com isso a nova missão dos camponeses deve ser de zeladores da natureza. Essas três condições - os fazendeiros capitalistas, o agronegócio como modelo e o capitalismo como modo de produção - não conseguem mais resolver.
Assim, estaremos diante de uma reforma agrária de novo tipo aqui no Brasil, na América Latina, e na maioria dos países do Hemisfério Sul, que não fizeram nenhuma reforma agrária popular anterior. O nome, o rótulo, não importa, o mais importante é que ela resolva os paradigmas apontados acima. Por isso, a reforma agraria atual não depende apenas dos camponeses, mas de todo povo, das forças populares em geral.
A reforma agraria atual não depende apenas dos camponeses, mas de todo povo, das forças populares em geral.
Com os processos de redistribuição de terra parados pelo governo, como devem agir os movimentos sociais e os próprios campesinos? A melhor aposta é em reformas radicais e populares?
Aqui no Brasil nós nunca tivemos um processo de reforma agrária ampla de nenhum tipo. Nem sequer a reformista, que foram experiências realizadas em alguns países da América Latina, que democratizavam a propriedade da terra, de forma parcial ou localizada. Tivemos apenas políticas de colonização em terras públicas, principalmente na fronteira agrícola da Amazônia Legal, e políticas de assentamento, quando se instalavam conflitos sociais decorrentes da luta dos camponeses.
Agora, diante das novas necessidades, nós precisamos, como movimentos camponeses, seguir o processo permanente de organização de nossas bases, conscientização política e elevação do padrão cultural, para que todos se deem conta das novas características de uma reforma agrária.
Ao mesmo tempo, levar o debate e todo processo para os movimentos populares, para as forças políticas de esquerda, para que entendam a etapa da luta social em que vivemos, que impõe a necessidade de debater um novo projeto popular para o Brasil. Não se trata apenas de debater a questão agrária. Precisamos debater a questão nacional para todo povo brasileiro.
Neste mês relembramos o “Abril Vermelho”, em memória dos 19 trabalhadores que foram assassinados em Eldorado dos Carajás (PA). Quais ensinamentos essa dor que começou 24 anos atrás nos traz hoje?
Na história das lutas camponesas no Brasil, infelizmente as oligarquias, a classe dominante, sempre atuou com extrema violência procurando abafar a luta pelos direitos sociais da maioria da população que vivia no campo. Assim eram reprimidos os trabalhadores escravos todos os dias no pelourinho ou com seus capitães-do-mato, para impedir as fugas. Assim foi quando surgiu o campesinato no final do século 19, com Canudos (BA), Contestado (PR/SC) e Caldeirão (CE), que foram as mobilizações mais conhecidas. Mas em todos estados houve rebeliões e massacres.
Depois, ao longo do século 20, muitas lutas camponesas foram reprimidas a bala. Inclusive contra as ligas camponesas e no golpe empresarial-militar de 1964 houve muitos mortos, presos e torturados, que ocorreram contra a base das ligas, movimentos e sindicatos até suas lideranças como Gregorio Bezerra, Francisco Julião, Clodomir de Moraes, Padre Francisco Lage, João Sem Terra, Lindolfo Silva, Zé dos Prazeres, etc.
Assim foi quando ressurgiram os movimentos camponeses, com a redemocratização a partir de 1984. Todos os movimentos camponeses, populares e sindicais sempre sofreram repressão da classe dominante quando quiserem se organizar e lutar. Há inúmeros casos individuais contra as lideranças ou coletivos. Nestes 40 anos de democracia fajuta foram assassinados mais de 1.600 companheiros e companheiras no campo. Menos de cem casos tiveram julgamento.  
É neste contexto que devemos analisar o massacre de Carajás, até hoje impune, pois os dois comandantes da PM condenados a mais de 200 anos de prisão até hoje estão em suas casas, por medidas liminares da justiça.
Aos militantes do campo e de toda sociedade, não podemos nos calar. Devemos denunciar sempre, aproveitar as datas, para além de homenagear a memória dos mártires, servir como alerta e denúncia para toda sociedade. Como disse o poeta Pedro Tierra sobre os massacres já havidos: “Se nos calarmos, até as pedras gritarão!”
Aos militantes do campo e de toda sociedade, não podemos nos calar.
O senhor acredita que a pandemia do novo coronavírus pode mudar, de alguma maneira, as relações no campo? Se sim, como?
A pandemia do coronavírus é a expressão mais trágica da etapa atual do capitalismo e da crise civilizatória que vivemos. Primeiro, porque há muitos estudos científicos demonstrando que a eclosão de diversos novos vírus, antes desconhecidos, é parte da consequência de termos desequilibrado as forças da natureza, com o modelo de produção agrícola industrial em alta escala. A maioria dos novos vírus tem se propagado através da criação em grandes escalas de animais, aves, suínos, bovinos, etc.
Segundo, que diante da eclosão de crises como esta, fica evidenciado a importância de nossa tese de que devemos defender a soberania alimentar. Ou seja, cada povo, em cada região, precisa ter autonomia da produção de seus alimentos. O comércio global de commodities agrícolas fracassou. Se a China parar de comprar soja durante duas semanas, o agronegócio brasileiro quebra, tal a dependência e sua fragilidade como modelo. Se uma greve de caminhoneiros durar duas semanas, falta frango nos supermercados de Belém, abastecidos desde Chapecó a centenas de quilômetros.
O comércio global de commodities agrícolas fracassou. 
Então, a pandemia vai ajudar a colocar em pauta o tema da soberania alimentar, dos alimentos saudáveis, da agroecologia e da necessidade de produzirmos próximo ao mercado consumidor. Isso somente é possível através da agricultura familiar e camponesa. Nesta crise, de que adianta dizer que somos os maiores exportadores de soja, milho, etanol, açúcar e gado bovino?
O que os cidadãos urbanos podem fazer para incentivar o fortalecimento da reforma agrária? Qual o papel deles na luta do campo?
Como disse antes, agora a reforma agrária não é mais um tema camponês apenas. Ela interessa a todo povo, e por isso dizemos que ela se transformou em reforma agrária popular. Porque as mudanças que devem ser feitas não serão apenas de estrutura da propriedade da terra, mas sim de paradigmas, da proteção da natureza, para evitar inclusive as mudanças climáticas, a falta de água na cidade e a produção de alimentos saudáveis. Para isso, todo povo terá que se mobilizar através de todas suas formas organizativas, desde associações de bairro, movimentos feministas, da juventude, negros, igrejas, sindicatos, movimentos e partidos políticos.
Ao mesmo tempo, a reforma agrária somente se realizará no bojo de mudanças estruturais socioeconômicas de toda sociedade brasileira. A militância precisa estudar, conhecer, debater um novo projeto, e organizar o povo para que lute por mudanças estruturais
Como conquistar espaço para mudanças governamentais na vigência de um governo ultraliberal e anti-popular?
A crise econômica profunda da atual etapa do capitalismo, a crise ambiental que estamos imersos, e as crises sociais e políticas delas resultantes, demonstraram que precisamos de mudanças também na democracia formal burguesa e no padrão dos governos.
A burguesia ainda tentou nos impor governos neofascistas, autoritários, em vários países.  Porém todos eles fracassaram. A maioria deles já caiu ou está também em crise. Ficaram por último na fila o governo da Hungria, Trump e Bolsonaro. Suas propostas ultraneoliberais e métodos de aplicação neofascistas, com ameaças e com teorias fantasiosas, estão sendo desmoralizadas em todo mundo.
No Brasil, aumentam as forças sociais e políticas que perceberam que o governo Bolsonaro é corresponsável pelo aprofundamento da crise. Portanto, ele é um entrave a mudanças para salvar o povo e melhorar as condições de vida. Os capitalistas não conseguirão sair da crise sozinhos, jogando todo o peso sobre o povo. A política econômica do senhor Guedes não deu certo no Chile, nos Estados Unidos e muito menos dará no Brasil. Os banqueiros e as corporações transnacionais estão sendo execrados em todo mundo, porque são os responsáveis por essa situação. Pode demorar semanas, meses, mas, como proposta hegemônica que orienta a sociedade, eles já acabaram. 
Os capitalistas não conseguirão sair da crise sozinhos, jogando todo o peso sobre o povo. 
Falta-nos ainda capacidade de organização e mobilização do povo que aglutine forças ao redor de um novo projeto de país. Espero que após o coronavírus o povo se levante. Estamos num período histórico, descrito pelos analistas como a situação em que o velho ainda não morreu e o novo não nasceu.
Edição: Rodrigo Chagas
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Dos Peabirus as Infovias Aeroporto de Cargas de Anápolis

 Dos Peabirus as Infovias Aeroporto de Cargas de Anápolis  DOS Peabirus ÀS INFOVIAS O AEROPORTO DE CARGAS DE ANÁPOLIS ESTÁ taquissiando     ...