terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Nossa Opinião da Semana: Falta coerência à Ancine



Escrito por Instituto Telecom, terça-feira, 14 de fevereiro de 2012   
Ter, 14 de Fevereiro de 2012 08:08
Na primeira Audiência Pública realizada pela Ancine sobre a regulamentação de dispositivos da Lei 12.485, dia 9/2, no Rio, ficou clara a falta de coerência da Agência ao propor mudanças que não só esvaziam o seu próprio poder de fiscalização como põem em risco um dos princípios mais importantes e historicamente reivindicados pela sociedade na luta pela aprovação da lei - a criação de cotas para conteúdos nacionais e independentes de qualidade.
A diretoria da Agência colocou em Consulta Pública duas Instruções Normativas relativas à Comunicação Audiovisual no Serviço de Acesso Condicionado (SeAC): uma de regulamento geral da Lei e outra que altera a Instrução Normativa (IN) 91, sobre o registro de agente econômico. O regulamento em discussão normatiza as funções das programadoras (empresas que programam o conteúdo audiovisual em canais) e das empacotadoras (empresas que organizam os canais em pacotes pré-estabelecidos) de TV por assinatura e trata da fiscalização do cumprimento das cotas de conteúdo.

Para Marcello Miranda, especialista do Instituto Telecom, a Ancine aos poucos abre mão das principais conquistas da lei e cede aos interesses do monopólio midiático. "A Globo está claramente pressionando a agência para que haja mudanças nessa regulamentação. Daí porque houve mudanças significativas do primeiro documento apresentado pela Ancine para o que está sendo colocado agora em Consulta Pública", protestou.

Diante das ameaças à Lei 12.485 com as modificações propostas para a IN 91, o Instituto Telecom e o Clube de Engenharia distribuíram no evento um manifesto questionando algumas ações da Ancine no processo de criação das regras, como as razões pelas quais a Agência estaria restringindo seus próprios poderes nas atribuições de fiscalização e de sanção.

As entidades chamam a atenção para a importância de toda a sociedade acompanhar esse debate, o primeiro em quase 24 anos após a Constituição Federal estabelecer como princípios a promoção da cultura nacional e regional, o estímulo à produção independente e a regionalização da programação nas emissoras de rádio e televisão, ainda que através da TV paga.

Na audiência, a principal preocupação da sociedade civil foi com relação às modificações propostas pela Agência na IN 91 e no Artigo 33 da IN que trata do SeAC. O texto proposto pela Ancine traz uma definição genérica na redação, utilizando a expressão 'entre outros', que deixa totalmente aberta a possibilidade do não cumprimento das obrigações e ameaça tornar nula toda a aplicação de cotas previstas na lei. Sobre esse aspecto, especialmente, a Ancine tentou se justificar afirmando que fará uma regulamentação futura, o que é ainda mais grave.

Marcio Patusco, representante do Clube de Engenharia, questionou à Ancine do porquê de a própria Agência estar limitando a sua atuação ao restringir os poderes de suas atribuições.  Mauricio Hitara, superintendente da área de fiscalização da Ancine, respondeu que se trata apenas de uma "sofisticação" da lei. Segundo ele, não haveria limitação dos poderes da Agência, mas um rearranjo dos procedimentos e penalidades. Para o Instituto Telecom, uma declaração perigosa e ambígua para o papel a que se destina a lei.

Os representantes da ABTA (Associação Brasileira de TV por Assinatura) e da ABPTA (Associação Brasileira dos Programadores de TV por Assinatura), entidades que foram contra o PL 29, o PLC 116, a Lei 12.485 e o regulamento do SeAC, tentaram mais uma vez esvaziar o debate. Alexandre Anneberg, presidente da ABTA, reduziu as importantes medidas democráticas trazidas pelos artigos da lei a uma "excessiva burocratização".  Já Carlos Alckimin, da ABPTA, que representa os programadores internacionais, repetiu o  velho discurso liberalista de sempre e chamou a criação de cotas de “intervencionismo da Ancine.”

Para Wolney Oliveira, diretor e membro da Associação de Produtores e Cineastas do Norte e Nordeste (APCNN) é preciso democratizar o debate. "A Ancine tem que agir como uma verdadeira Agência Nacional de Cinema e descentralizar essas audiências que estão acontecendo apenas no eixo Rio X São Paulo." Marcello Miranda, que também é conselheiro da Anatel, sugeriu que houvesse um espaço de participação ativa da sociedade civil nas decisões da Ancine, a exemplo do que ocorre na Anatel que possui um Conselho Consultivo constituído por representantes de diferentes setores da sociedade. O Conselho Consultivo requer informações e faz proposições a respeito das ações do Conselho Diretor.

Ontem foi realizada em São Paulo a segunda audiência pública sobre o tema. Mas, a previsão de uma definição maior sobre os questionamentos da sociedade ainda continua genérica. A agência disse que espera publicar em março sua proposta para as penalidades para quem não cumprir as obrigações de cotas de conteúdo nacional previstas na Lei. E talvez, ainda no primeiro semestre sejam definidas as INs referentes à fiscalização, canais obrigatórios, direitos autorais das produções nacionais, concorrência e à reserva de recursos do Fundo Setorial do Audiovisual.

Diante desse quadro incerto, o Instituto Telecom reafirma que o debate sobre o SeAC é importante para a regulamentação da Lei 12.485 e ainda poderá servir como um roteiro para a discussão do novo Marco Regulatório das Comunicações.

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