sexta-feira, 18 de março de 2022

 

Ex-presidente da Petrobras explica por que gasolina e gás estão caros

Em entrevista à TvPT, Sergio Gabrielli mostra como a política adotada pelo governo Bolsonaro faz a Petrobras ter grandes lucros às custas da população brasileira 
 18/03/2022 14h12 - atualizado às 14h51
Carol Garcia/Secom

Gabrielli: "Com Lula e Dilma, a Petrobras tinha lucro sem passar para o brasileiro todas as flutuações internacionais"


“Estamos vivendo o resultado de uma política que começou a ser implementada a partir de 2016, com a derrubada da presidenta Dilma”, afirmou. “Estamos vendo uma distribuição de renda perversa, que tira da população brasileira e passa para um grupo muito pequeno de acionistas”, acrescentou Gabrielli, que comandou a Petrobras entre 2005 e 2012, nos governos Lula e Dilma, portanto (assista à íntegra da entrevista no fim da matéria).O ex-presidente da Petrobras Sergio Gabrielli explicou, durante entrevista à TvPT, nesta sexta-feira (18), como o Brasil chegou à atual crise dos combustíveis, na qual o consumidor paga preços altíssimos pela gasolina, pelo diesel e pelo gás de cozinha enquanto os grandes acionistas da empresa nadam em dinheiro.

O executivo explicou que a política adotada por Michel Temer e mantida por Jair Bolsonaro fez o Brasil produzir cada vez menos combustível em suas próprias refinarias e a depender cada vez mais das importações. 

“Nos últimos anos, a Petrobras reduziu o uso de suas refinarias e abriu espaço para novos importadores de gasolina, diesel, querosene de aviação e gás de cozinha. Hoje, temos quase 400 importadores funcionando no Brasil, que importa um quarto da gasolina, quase um terço do gás de cozinha e um quinto do diesel. Ao fazer essas importações, você passa a depender fortemente dos preços internacionais”, disse.

Petrobras é vendida em fatias

A redução da produção nas refinarias é parte da estratégia de privatização da Petrobras, que vem sendo vendida em fatias. Já foram entregues para a iniciativa privada a BR Distribuidora e refinarias na Bahia, a mais antiga do Brasil, comprada por um fundo árabe, no Rio Grande do Norte e no Paraná. “Tudo isso diminuiu nossa capacidade de influir no mercado”, observou Gabrielli.

O resultado é o que se vê agora. A Petrobras dá lucro, mas às custas do povo brasileiro, que acaba pagando mais sempre que o preço dos combustíveis sobe no mercado internacional. E pior: o lucro que esse aumento dos preços gera não tem servido para fortalecer a empresa nem a economia nacional, pois a direção tem dado quase todo o dinheiro aos acionistas, em grande parte estrangeiros. 

“Dos R$ 106 bilhões de lucro em 2021, a Petrobras distribuiu em dividendos (dinheiro entregue aos acionistas) R$ 101 bilhões. Portanto, o volume utilizado para fazer a empresa crescer é mínimo. E isso penalizando o consumidor, passando para o mercado doméstico todas as variações do preço internacional”, pontuou Gabrielli. “Você está utilizando o lucro não para crescer a empresa nem para integrá-la à economia brasileira, mas para distribuir dividendos para os seus acionistas, dos quais 63% são privados, e, desses, mais de 48% são internacionais.

Com Lula e Dilma, lucro e preços baixos

Gabrielli explicou que, durante os governos Lula e Dilma, a política adotada era bem diferente. A Petrobras era uma empresa integrada, ou seja, que extraía petróleo e gás, fabricava combustíveis e gás de cozinha e vendia esses produtos. Tratava-se de uma política chamada do poço ao posto, ou, como ressalta Gabrielli, do poço ao poste, já que a empresa também produzia energia elétrica. 

Assim, era possível fazer uma compensação dos preços, sem repassar toda variação do mercado internacional para os consumidores brasileiros. “A lógica que se adotava naquela época era a de uma empresa integrada de energia, que era capaz de administrar (os preços). Ora os preços do petróleo sobem muito e a margem do refino diminui, ora os preços do petróleo caem e a margem do refino aumenta. Quando você está integrado nas duas pontas, você consegue estabilizar a receita ao longo do tempo. Isso é o que as grandes empresas de petróleo fazem, mas a Petrobras está indo na direção inversa. Está desintegrando a empresa e se tornando cada vez mais submetida às variações dos preços internacionais”, esclareceu.

Além disso, havia uma preocupação em utilizar a Petrobras para gerar emprego e impulsionar a indústria nacional. “Ela seguia uma política de conteúdo nacional, que aumentava as compras de plataformas, sondas, equipamentos submersos, equipamentos para refino e produção dos vários segmentos da empresa no mercado brasileiro. Com isso, estimulava a indústria naval brasileira, a engenharia pesada brasileira”, recordou o ex-presidente da estatal.

Nada disso impedia que a Petrobras desse lucro, ressaltou Gabrielli. “Em termos de dólares, o lucro de 2011 foi maior que o lucro de 2021”, citou, explicando que, quando se transforma o lucro para a moeda americana, os ganhos da empresa em 2011 foram de US$ 21 bilhões, enquanto, no ano passado, de US$ 19 bilhões. “Não é verdade que, no período Lula e Dilma, a Petrobras não tinha lucro. Tinha lucro, mas sem passar para o mercado brasileiro todas as flutuações internacionais”.

Responsabilidade de Bolsonaro

Tudo isso, porém, foi desfeito a partir de 2016, para prejuízo da população brasileira, verdadeira dona da Petrobras, mas que não consegue encher o tanque do carro nem comprar um botijão de gás de cozinha. E tudo deve piorar, se for mantida a estratégia atual, que é responsabilidade sim de Bolsonaro, pois o governo tem o poder na hora de constituir o conselho da empresa.

Basta ver o que acontece hoje na Bahia, onde fica a primeira refinaria vendida pelo governo Bolsonaro. O estado sofre com o combustível mais caro do país, uma vez que o fundo árabe que comprou a empresa produtora de combustíveis tem mais compromisso com seus lucros, evidentemente, do que com a economia local. 

“A venda das refinarias vai ser um problema. A Bahia já tem o combustível mais caro do Brasil. A escolha do perfil de produção da refinaria vai, provavelmente, ao longo do tempo, criar alguns problemas no fornecimento de derivados no mercado baiano. E a integração com a economia baiana também está se diminuindo com o aumento e entrada de fornecedores de fora da Bahia para atender as necessidades da refinaria”, alertou Gabrielli.

Da Redação

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