Carlos Saraiva*
A segunda metade do século XIX, caracterizou-se pelo fortalecimento do Liberalismo e a constituição de burguesias bem definidas tanto nos EUA como na Europa.
Isto facilitou a consolidação de um Estado Liberal e Democrático de Direito, onde puderam ser efetuadas Reformas burguesas consensuadas, com pouca disputa de cunho
Ideológico. A principal delas foi a Reforma Agrária. A necessidade de ordenar a vida no campo, preparando para enfrentar a forte industrialização e urbanização que se intensificava.
A necessidade de produção de alimentos de maneira mais organizada , racional e produtiva. A necessidade de retorno e melhor qualidade de vida do camponês, para um melhor equacionamento
da vida urbana. Estes fatores que desembocariam para o avanço do capitalismo , com melhora do nível de vida do campesinato e das condições de exploração do operariado, desideologizaram o processo.
A América do Sul e em especial o Brasil, viu passar o trem da história e não constituiu um verdadeiro Liberalismo. A nossa Burguesia não se definiu e o nosso Estado Liberal Democrático de Direito não se consolidou.A falta de uma burguesia nacional consolidada, resquício da colonização e do escravismo, não forneceu as ferramentas necessárias para o estabelecimento de um mínimo consenso , para a efetivação
De reformas em especial a Agrária. Este processo necessário, se não consensuado , constituiu-se em uma disputa fortemente ideologizada. A abolição da Escravidão, A República, A revolução de 30, não foram suficientes para a consolidação de uma efetiva Burguesia Nacional. A não resolução do problema do campo, contribue para que as nossas elites continuem fragmentadas, sem constituírem uma burguesia que possam consensuar reformas e muito menos consolidarem um Estado Liberal Democrático de Direito. Isto alem de aumentar a ideologização da disputa agrária dificulta o equacionamento de um capitalismo industrial, nacional e uma urbanização mais racional e humana. O Brasil caminha, histórica, política e sociológica de uma maneira completamente esquizofrênica.
Hoje, temos no campo um embate entre o chamado Agro Negócio e a Agricultura Familiar, traduzindo a disputa ideológica.
Esta disputa me parece falsa. Os velhos coronéis que representavam a oligarquia do campo estão em decomposição, assumindo este vazio, os novos profissionais urbanizados. A associação da técnica, do poder econômico e as multinacionais montaram uma estrutura poderosa e “moderna”. Esta estrutura, voltada para a exportação, passou a ter extraordinária importância na balança comercial brasileira. A agricultura familiar de suma importância na alimentação do povo brasileiro, alem de sadia, sustentável e sustentada, produz o maior número de empregos no campo. Infelizmente, táticamente cai na armadilha do chamado Agro negócio. O chamado Agro Negócio, usa o discurso da “modernidade” dentro do Estado de Direito e a força motriz da balança comercial contra o “atrazo” e a “baderna” dos que atuam na “ilegalidade” sem contribuírem para o “crescimento” do Brasil. Este discurso esconde o caráter ideológico da disputa. Acho que a Agricultura familiar com o enfoque ideológico que tem, deve também se constituir como um grande negócio do campo. Este Agro Negócio, sustentável, sustentado, limpo, cooperativo,associativo e solidário, tem de se fortalecer. Este fortalecimento se dará pela técnica, o profissionalismo e sobretudo pelo comprometimento social. A reforma Agrária está caminhando por ações marginais, paralelas, mas politicamente eficazes e eficientes. Alem do assentamento de famílias, cujo número não pode ser desprezado, ações que melhoram as condições de vida no campo, vão forçando as elites agrárias atuais à se reciclarem . Até como sobrevivência, pois uma nova hegemonia agrária poderá ganhar força para a costura de novos consensos que poderão resultar em uma Reforma Agrária de qualidade. Estas ações são o maior financiamento para a Agricultura Familiar. A educação , saúde e assistência técnica, O Bolsa Família, Luz para Todos e a Economia Solidária são instrumentos importantíssimos nesta direção. Este aparente paradoxo que alguns “intelectuais” de “esquerda”, chamam de “hegemonia às avessas”, ou seja “o dominado conduzindo a politica em beneficio do dominante”, poderíamos dizer ; “os dominados conduzindo a política que os dominantes não tiveram a capacidade de faze-la, para constituir uma nova hegemonia”. Os dominados agora não como coadjuvantes, mas como protagonistas. Uma nova hegemonia que pode forçar as classes dominantes à travarem uma luta de classe com espírito de nação fortalecido.
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