Tive a oportunidade de participar de seminário promovido pela Rede de Educação Cidadã do Distrito Federal e Secretaria de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda (Sedest) do governo local. O painel de debate estava marcado para as 9h30 de uma manhã de domingo, trânsito nada complicado, e os painelistas, integrantes do governo do Distrito Federal, não chegavam. Ao justificar o atraso, confessaram que não achavam o local. Conheciam pouco ou nada o Quará 1, local do evento, público, Centro de Capacitação da Sedest.
O tema do seminário era Educação popular orientado a construção de políticas públicas. O objetivo, nos próximos quatro anos, é atingir 100 mil famílias do Distrito Federal, 400 mil pessoas, que recebem o Bolsa Família ou outros benefícios do governo federal e governo da capital federal, no combate à extrema pobreza, como propõe a presidente Dilma. Este é o número de pobres ou miseráveis de Brasília. E não estamos falando de uma capital ou cidade grande do Nordeste, mas sim da principal e mais rica cidade brasileira.
É preciso saber quem são essas 400 mil pessoas, onde moram, quais suas necessidades imediatas, como sobrevivem. A educação popular, na metodologia de Paulo Freire, parte da realidade, da vida, do que as pessoas pensam, dos seus problemas, valores, nunca da teoria. Abre-se um diálogo e uma reflexão com pessoas e comunidades: descobrir as causas da pobreza, porque ela acontece, quem são seus responsáveis, como aconteceu na história. Então, acontece uma construção coletiva, na organização de pessoas e comunidades, na consciência de sair de sua situação, e pode estabelecer-se uma parceria entre governo e sociedade. Discute-se um modelo de desenvolvimento que não produza mais pobreza e miséria e visualiza-se um projeto de sociedade solidário, com justiça social e igualdade.
O governo do Distrito Federal propõe a construção de uma proposta que respeita o saber do povo, com ele constrói políticas públicas e programas, com o povo e as comunidades organizadas e conscientes abre o diálogo. Não se quer fazer nada de cima para baixo, muito menos de forma assistencialista ou clientelista.
Como falou o Janjão, do MST, representante dos movimentos sociais no painel, é preciso fortalecer o protagonismo popular, incentivando a cidadania ativa, a construção de sujeitos de direitos e a autonomia de pessoas e comunidades na busca de uma vida digna. Os governos devem ser parceiros desses processos, para a construção de uma sociedade democrática, solidária e com igualdade social e econômica.
Daniel Seidel, secretário adjunto da Sedest-GDF, falou que a organização do povo quase foi destruída nos últimos anos em Brasília. Sobraram alguns focos de resistência, a serem (re)fortalecidos. Por isso, a participação popular, com o Orçamento Participativo e demais políticas, não será um passeio. “Não se muda o andar de uma carroça como essa facilmente e em pouco tempo. É preciso criar fóruns sociais nas cidades, estimular a participação social, fazer processos formativo-educativos nos valores da educação popular, para que a população veja resgatada sua autoestima e se sinta participante e construtora das políticas e estabeleça uma parceria governo-sociedade baseada na democracia, no respeito e na construção coletiva.”
A Rede de Educação Cidadã-DF, com seus educadores/as, lideranças sociais e comunitárias, coloca-se a serviço e busca contribuir com esta caminhada generosa, plena de sonhos de construir o novo e o diferente, resgatar a dignidade do povo que tanto sofre, mas vive na esperança e na luta por um mundo e uma sociedade melhores.
Conhecer e transformar são exigências recíprocas, dizia Paulo Freire. Mais que conhecer a geografia, chegando ao lugar certo na hora prevista, é preciso conhecer rostos, endereços, casas, a ausência de esgoto, a falta de alfabetização, o desemprego, as doenças das crianças, as perspectivas dos jovens, o cansaço dos idosos, como também desejos, valores, sonhos, para transformar. Transformar, sim, ruelas, becos, áreas de risco, mas sobretudo transformar vidas, sonhar a liberdade, criar utopias. Um pouco de tudo isso está (re)nascendo em Brasília, capital de todas as brasileiras e brasileiros.
*Selvino Heck é assessor especial da Secretaria Geral da Presidência da República.
Fonte:Jornal do Brasil
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