por Damiana Campos - Mestrando em Ciências Sociais - CPDA/UFRRJ - do Instituto Rosa e Sertão
Dona Lorença - Mudou-se da comunidade devido problemas de saúde, mas chora ao lembrar de sua morada.Esta foto acima foi tirada pelas comemorações na comunidade do ´Prêmio Culturas Populares/MinC - 2010
Grupo Manzuá na apresentação em São Jorge/GO.
Cadê o Manzuá? Ainda está lá.
Foi assim que chamei a atenção no Grupo de Trabalho "Comunicação" do IV Encontro Nacional de Comunidades Quilombolas. Este grupo teve por objetivo elaborar encaminhamentos na temática Comunicação para que as comunidades quilombolas tenham meios de se comunicarem e de receber notícias sobre o que está acontencendo nos movimentos sociais e nas políticas públicas.
Como já apresentado neste blog a Comunidade Quilombola Retiro dos Bois fica a 60 km de distância do município de Chapada Gaúcha/MG e 250 km da sua cidade Januária/MG - esta divisão é territorial. Há uma luta abafada a mais de 10 anos pelo reconhecimento deste território como um chão povoado por GENTE e não apenas por terras soltas. Esta busca incessante pela passagem da área das comunidades de Patos, Angical e comunidade quilombola Retiro dos Bois para administração do município de Chapada Gaúcha já deixou muita gente doente ou morrer sem ver uma solução.
O fato é: não há uma política pública e assistência as comunidades que estão mais 250 km de sua cidade. Como fazer esta logísitca de: Assitencia médica, Agentes de Saúde Rural pelo menos 1 vez por semana? Merenda escolar de qualidade pelo sistema do PAA? Professores capacitados e bem remunerados dando aula em um ambiente satifatório? Alunos com uma infraestrutura que garanta a sua permanência na escola e uma boa aula que abram os olhos para um mundo melhor lá? Como dizer a estas pessoas que estão num paraíso, onde o Rio Carinhanha é o seu maior tesouro, sendo que são humilhados e sem chão quando pedem assistência básica e de direito garantido pela constituição? Como garantir que grandes fazendeiros não comprem estas terras por preços abaixo do valor de mercado, sendo que o valor que deveriam ter era apenas de serem reconhecidos como GENTE? E agora?
Este fato é dado por muitos moradores de Chapada e também por aqueles que são “parentes”. Todos são sabedores da interferência nas relações sociais não apenas enquanto o deslocamento como forma física, mas também psíquicas e morais.
Mas é percebido também na fala de alguns moradores da região que o pertencimento a esta terra destinada e sua identidade territorial depende não somente de suas mãos ou vozes:
"Se é tempo de política muitos são Chapada Gaúcha, se é tempo de doença são Januária, mas não dá tempo de chegar até lá e precisam ser Chapada, mas agora tão dizendo que a gente não pode mais ser de Chapada por causa do cartão SUS. Este trem não tá certo não, como é que eu vou lá para Januária se eu tô doente minha irmã?". (moradora da comunidade Retiro dos Bois)
Outro caso de um morador de 60 anos sobre a dificuldade de logística territorial:
"Eu tô pra tirar uma chapra e não posso mais, por que disseram que só atende emergência, agora eu tenho que morrer pra me atender". (morador da comunidade quilombola Retiro dos Bois)
Esta situação é diária no Posto Médico de Chapada Gaúcha que ainda faz muito para com a comunidade, mas devido à burocracia não podem mais realizar os encaminhamentos que já faziam há mais de 10 anos.
Procurando funcionários do Centro Médico fomos informados que devido novo Sistema, este informatizado e que libera os encaminhamentos para exames e consultas fora do município, todos os cadastrados pelo município de Januária tem que encaminhar seus exames para serem feitos no próprio município que faz parte e que apenas casos emergenciais poderiam ser realizados lá.
Foi ainda apresentado o acordo com a Prefeitura de Januária, onde incluí apenas UM paciente mês para atendimento e exames. Isso sim é um desagravo aos direitos constitucionais.
Os moradores pedem SOCORRO!!!
Não podemos deixar isso acontecer com uma comunidade que é referencia cultural e que encanta a todos com sua alegria e seus tambores. As violas estão de luto mais uma vez.
Há um quase um ano a comunidade aguarda retorno sobre a morte de um dos moradores da comunidade - brutalmente morto com 8 tiros por um sargento da PM a paisana numa festa da cidade - este caso também sem notícias ou mesmo soluções.
Estas ações e acontecimentos somente levam a auto-estima a nível zero, mas mesmo assim eles ainda continuam a cantar:
Oiê cadê o Manzuá?
Ainda está lá.
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